31/05/2023 às 14h04min - Atualizada em 31/05/2023 às 14h04min

Gosto não é só gosto

Nossas preferências também são fruto de construções sociais

Luciana Hage

Luciana Hage

Mini-bio: Relações Públicas. Mestre em Ciências da Comunicação.

Essa semana um vídeo do Professor Guilerme Terreri, que performa a Drag Queen Rita Von-Hunty, em uma entrevista à escritora Tati Bernardi, no canal do Universa, falou que não só o que comemos é um ato político, mas as pessoas com as quais escolhemos nos relacionar também o é.

O Prof. Guilherme trouxe para essa conversa os debates sobre as construções sociais diante das nossas escolhas. Afirmando que essas escolhas pessoais, específicas, e íntimas até, não são deslocadas daquilo que é produzido coletivamente do que se entende por belo e aceitável.

Ou seja, quando dizemos que prefiro tal “tipo” de pessoa para namorar, ou ter qualquer tipo de relacionamento, estamos o fazendo com base no que apreendemos sobre quem são, e quem não são, passíveis de serem “escolhidos”. 

Num trecho da entrevista, o Prof. Guilherme pergunta: “você nunca se relacionou com uma mulher preta e acha que isso é só questão de gosto?”. Alguém já se fez essa pergunta e obteve uma resposta lógica? 
Podemos fazer a mesma pergunta para saber se pessoas gordas, magras, musculosas, altas, baixas, deficientes, entre tantas outras, fazem parte das nossas possibilidades de relacionamento. E se não fazem, quais os motivos?

Essa abordagem causou estranheza para algumas pessoas, compreensivamente diga-se de passagem. Afinal, como pode ser construção social se, em tese, temos autonomia para decidir nossas escolhas por conta própria?
Pois então. A grande questão é essa. Dificilmente temos autonomia sobre nossas escolhas, pois vivemos em uma sociedade que nos ensina desde muito cedo as regras do jogo das interações. 

A partir do momento que somos levados a acreditar que existe, por exemplo, coisas de menino e coisas de menina, e que uma não pode interferir na outra, não nos dão autonomia de escolha. Nos impõem regras.
Da mesma forma quando nos fazem crer que a mulher deve ser submissa ao seu esposo porque esse é o papel dela. Ou quando mulher teria que receber salários inferiores porque engravida. E ainda, que é antinatural que pessoas do mesmo sexo possam construir família. 

Tudo isso são crenças construídas socialmente com o interesse de controlar nossas escolhas. Criam-se diante te todas essas questões um pânico moral para que as regras não sejam quebradas e assim as estruturas permaneçam como sempre estiveram.

E isso embasa as possíveis punições para aqueles que rompem com lógica instituída, e constantemente há quem o faça (ainda bem!). Há lugares do mundo que pessoas são condenadas à morte por alguns desvios de normas. 

Toda essa abordagem, da produção social dos gostos, não é nova. Há séculos isso vem sendo discutido por estudiosos. Talvez desde a Grécia antiga o belo vem sendo construído como uma pessoa branca, de corpo atlético e europeu, claro. E essa seria a referência para as nossas preferências.

É preciso ampliar os horizontes dos nossos olhares sobre nossas escolhas e resistir ao desejo de fazer parte de uma lógica excludente, que não admite diversidade de corpos nas relações de afeto.

A beleza é muito maior que um corpo, que a cor da pele, que o sexo biológico de uma pessoa. Ser masculino e feminino também é muito mais amplo que usar rosa ou azul. Não existe coisas de mulheres e coisas de homens. Existem muitas formas de se relacionar com as pessoas e com o mundo, respeitosa e harmoniosamente.

Fiquemos mais atentas, atentos e atentes para as armadilhas do sistema que deseja controlar até a nossa intimidade.
Link
Leia Também »
Comentários »
Comentar

*Ao utilizar o sistema de comentários você está de acordo com a POLÍTICA DE PRIVACIDADE do site https://jornalpara.com.br/.
Fale pelo Whatsapp
Atendimento
Precisa de ajuda? fale conosco pelo Whatsapp