Nunca é demais dizer o que precisa ser dito, fazer o que precisa ser feito, mesmo correndo-se o risco de ser redundante ou repetitivo, porque o óbvio pode não ser evidente aos olhos das pessoas, sejam elas de dentro ou de fora de uma temática qualquer.
Vejam só o caso da aprovação do PL-1085/23, pela Câmara dos Deputados no último dia 4, por 325 a 36 votos, que obriga empresas privadas a pagarem o mesmo salário para homens e mulheres que desenvolvam as mesmas atribuições.
Alguém pode está se perguntando: mas por que precisa de um PL pra isso, que é tão óbvio que deveria ser assim? Como pode, mulheres serem submetidas a salários inferiores quando faziam exatamente o mesmo trabalho que os homens?
Pois então! Desde que as mulheres saíram de suas casas para trabalhar foi assim. Parece até uma punição pelo fato de se “atreverem” a sair de casa para trabalhar fora.
E olha que isso nem tirou delas a “obrigação” das tarefas do lar e com os cuidados da família. Por isso muitas delas ainda têm jornadas duplas ou triplas.
E pensar que muitas mulheres são arrimo de família, cabendo a elas o peso do sustento do núcleo familiar. Cerca de 42% dos lares brasileiros, segundo levantamento do IBGE de 2018, têm a mulher como pilar principal e, muitas vezes, único.
Diante disso, o lógico seria que elas ganhassem bem mais que eles, afinal, suas atribuições extrapolam o ambiente de trabalho para garantir o bem estar de toda a sociedade. Imaginem só, se as mulheres deixassem de executar suas “obrigações” com os cuidados dentro de casa. Imaginem o caos que seria para toda a sociedade.
Não é fácil trabalhar 40 horas semanais, voltar pra casa e ter de cuidar dos afazeres domésticos e ainda ajudar os filhos com as lições da escola. Ter de preparar as refeições, acordar mais cedo pra deixar os filhos nas aulas e seguir para a rotina de trabalho.
Seria óbvio que elas tivessem os maiores salários, não? Mas ganhar menos não deveria ser uma possibilidade, ao menos. Parece que, pelo menos na Lei, essa realidade será modificada.
Outra obviedade é o fato de até os dias atuais mulheres não ocuparem determinados casos. No mesmo dia da aprovação do PL pela Câmara dos Deputados, Amanda Teixeira, servidora de carreira da Secretaria Nacional de Serviços Penais foi nomeada para assumir a direção da penitenciária federal do Distrito Federal.
É a primeira vez que uma mulher vai gerir essa instituição em 17 anos. A importância do cargo é muito grande, pois trata-se de uma penitenciária masculina, para onde são levados um tipo bem específico de criminoso, geralmente envolvidos com o crime organizado.
Outras 4 penitenciárias federais estão nos estados de Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio Grande do Norte e Rondônia. Todos terão novos dirigentes, no entanto, serão homens.
Com certeza têm outras Amandas no sistema de segurança pública brasileiro, tão qualificadas quanto, mas possivelmente não terão a mesma oportunidade para dirigirem uma dessas instituições, infelizmente. Enquanto isso, há muitos homens que, talvez, não tenham as mesmas qualificações das Amandas, mas sempre serão lembrados, primeiro, para os cargos de gestão.
Uma pesquisa realizada pela ONU, através do Índice de Desenvolvimento de Gênero (IDG), em 2019 mostrou que mulheres estudam cerca de 8,1 anos enquanto homens, 7,6, no entanto elas ganham cerca de 42% menos que eles e poucas vezes são consideradas em processos seletivos para cargos de chefia.
Os dados são claros e mostram a injustiça sofrida por mulheres no mercado de trabalho, por isso a importância da aprovação do PL-1085/23, que ainda terá de passar por análise e aprovação do Senado. Espera-se que ele seja consolidado. É o mínimo a ser feito.
O PL não é a solução do problema, é sabido, mas é a luz que pode guiar as demandas das mulheres, que passarão a ter o direito garantido. Ainda que se saiba que a Lei não é sinônimo de efetividade, mas ela poderá ser bússola para travar abusos.
Que mais Amandas possam assumir cargos de comando na iniciativa pública, mas também na privada. E que o óbvio seja dito mais vezes porque assim as desigualdades poderão ser reduzidas para o bem-estar de toda a sociedade.