A democracia não só permite como lhe é essencial a existência de grupos políticos antagônicos, com visões distintas sobre economia, o tamanho do estado, sobre políticas públicas nas áreas da educação, saúde, saneamento etc., bastando que cada grupo alcance o poder por meio do voto popular para, nos termos da lei, implementar seu plano de governo, cabendo ao povo avaliar acertos e erros da políticas implementadas.
Mas a democracia jamais poderá permitir que possam existir grupos e discursos políticos que desvirtuam criminosamente o conceito de liberdade (de expressão ou manifestação) para pregar a destruição do próprio estado democrático de direito.
É importante que se deixe muito bem registrado: não existe liberdade fora da democracia!
Muito bem. Em que pese a salutar divergência de ideias entre grupos políticos concorrentes, o que se viu nos Brasil nos últimos anos, especificamente entre 2019 e 2022, foi um grupo de radicais liderados por uma família com poderes imperiais - a qual foi catapultada para o centro do poder nacional com acomodações na cadeira do poder executivo e nas duas casas de leis, Câmara dos Deputados e Senado Federal – que tentaram implodir os pilares do estado democrático de direito para, a todo custo, permanecer no poder.
Acontece que esse grupo, coordenado pelo líder principal, Jair Bolsonaro, a partir de 2019, ignorou a forma pela qual seus membros chegaram ao topo do poder central, ou seja, através do voto popular, e passou a utilizar os holofotes que o poder proporciona para criar um cenário de caos democrático, minando por dentro as instituições, as autoridades e a própria Constituição Federal.
Paralelamente à criação de uma cortina de fumaça para esconder sua completa incapacidade administrativa, os engenheiros do caos utilizaram táticas antigas de comunicação, utilizadas em regimes totalitários, para imbecilizar parte dos seus apoiadores, transformá-los em idiotas úteis, como bem disse certa vez o próprio ex-presidente, e criar uma seita perigosa e armada, por meio da política armamentista implementada. Tudo construído meticulosamente ao longo de quatro anos de mandato presidencial.
Outro importante componente para a criação da realidade paralela na qual vive parte dos apoiadores do Jair Bolsonaro trata-se das redes sociais, que há muito desafiam e abalam as grandes democracias mundiais com conteúdos conspiratórios milimetricamente criados pelo submundo da internet e que impactam a vida real da sociedade.
No Brasil, nos últimos anos, os engenheiros do caos utilizaram a esgotosfera das redes sociais para minar as estruturas do estado democrático e conseguiram criar uma seita de fanatizados que facilitam a disseminação de palavras/conceitos aptos a capturar incautos e oportunistas, tais como: o culto à personalidade de um “líder” político; o militarismo; o pragmatismo (adotar ou mudar de ideias rapidamente a depender do proveito obtido sem se importar com contradições); o anti-intelectualismo; a propaganda; a mentira; a violência (política de desarmamento); a religião (o uso da religião como instrumento de poder/voto); o anticomunismo; o medo; e o nacionalismo.
O Brasil passou a ser o mais novo exemplo mundial de uma estratégia de subversão da ordem constitucional para permanência no poder de um grupo político que não possuía qualquer apego às regras democráticas, o que pode ser exemplificado na tentativa golpista do último dia 8 de janeiro em Brasília.
Por certo, apesar da derrota de Jair Bolsonaro nas urnas em 2022, o caldeirão das teorias conspiratórias ainda permanece aceso nas profundezas da internet e continua a alimentar a imaginação fértil de pessoas que tiveram suas mentes capturadas e se transformaram em importantes e perigosas replicadoras de desinformação.
Além de punir todos os responsáveis que conspiraram e agiram para abolir o estado democrático de direito brasileiro, é preciso criar mecanismos para prevenir novos ataques e fortalecer as barreiras de contenção, sem esquecer do debate sobre o uso criminoso das redes sociais para fins políticos.