O Brasil viveu um momento histórico no último dia 8 de janeiro de 2023, quando centenas de pessoas invadiram e destruíram as sedes dos três poderes da República no Distrito Federal no intuito de abolir de forma violenta o Estado Democrático de Direito, atos que podem se enquadrar como os crimes dispostos nos artigos 359-L e 359-M do Código Penal.
As penas para os crimes contra o Estado Democrático de Direito, tipificados no Código Penal, variam entre 3 a 15 anos, a depender da conduta praticada.
Que o dia 8 de janeiro de 2023 ficará para a história do Brasil ninguém tem dúvida, mas o destaque não será positivo; ao contrário, será uma data para se lamentar, pois foi o dia em que a atuação coordenada de vários golpistas, alguns conscientes e outros incautos, promoveu uma das cenas mais lamentáveis da jovem democracia brasileira.
O prejuízo da destruição física das sedes dos três poderes não foi maior do que o prejuízo à imagem do Brasil pelo mundo, apesar das inúmeras mensagens de solidariedade e apoio de diversas autoridades internacionais. Na verdade, a democracia brasileira é a bola da vez dentro de uma onda extremista que assola os continentes, assim como aconteceu com os Estados Unidos na invasão do capitólio, em 6 de janeiro de 2021.
A comunidade internacional, incluindo a ala democrática e os regimes autoritários, assiste aos acontecimentos no Brasil para identificar qual proveito poderá tirar dos resultados oriundos das respostas das instituições brasileiras.
No final de novembro de 2022, o Instituto para a Democracia e Assistência Eleitoral (IDEA Internacional) publicou estudo que sinaliza que a democracia sofreu fortes retrocessos em vários países no mundo, com destaque para a América Latina, e o Brasil é um dos expoentes.
E é justamente promovendo esse retrocesso democrático que os autocratas se colocam como opção à sociedade.
Como a quarta maior democracia do planeta, o Brasil possui grande influência mundial, especialmente nos países emergentes e os abalos democráticos sofridos ao longo de todo o Governo Bolsonaro, de 2019 a 2022, colocaram o Brasil como uma espécie de laboratório internacional para a democracia.
Falando em Jair Bolsonaro, já era sabido que os efeitos devastadores do seu Governo iriam perdurar por muitos anos dentro de várias áreas da administração pública, mas, infelizmente, a herança maldita também está afetando a ordem democrática.
Como se não bastasse o ataque brutal às instituições democráticas brasileiras nos atos golpistas de 8 de fevereiro, na data de ontem - 10/01, após decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, decretando o afastamento do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, e a prisão do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de segurança pública do Distrito Federal, Anderson Torres – o ex-presidente Jair Bolsonaro publicou na sua conta no Facebook um vídeo que promove novos ataques infundados contra o TSE e STF, ativando a mente fértil dos seus seguidores mais fanatizados.
No vídeo, Jair Bolsonaro volta a fazer ataques irresponsáveis e completamente fora de qualquer base fáctica sobre a segurança do processo eleitoral, veiculando conteúdo que afirma que o presidente “Lula não foi eleito pelo povo. Ele foi eleito pelo STF e TSE”.
Essa narrativa falaciosa de Bolsonaro contra o processo eleitoral foi amplamente difundida entre seus seguidores com bastante antecedência do dia da eleição justamente para incutir na mentalidade das pessoas que se ele ganhasse era pelo fato de ter um amplo apoio popular, a ponto de anular qualquer interferência ilegal em sua eleição, mas se perdesse era porque havia ocorrido fraude no processo eleitoral.
Essa absurda e irresponsável narrativa não encontram amparo na legislação eleitoral visto que os partidos políticos, o Ministério Público, a Ordem dos Advogados do Brasil e outras importantes instituições nacionais possuem o direito de fiscalizar toda a organização do processo eleitoral. Aliás, muitos partidos deixam de enviar seus representantes nos dias dos testes das urnas eletrônicas, realizados pela Justiça Eleitoral, justamente por acreditar na seriedade da condução dos trabalhos.
Mas esse entendimento já é de conhecimento de Jair Bolsonaro, que já foi eleito uma vez vereador do Rio de Janeiro, sete vezes Deputado Federal e uma vez presidente da República, e todas as vezes os trabalhos foram conduzidos pela Justiça Eleitoral e a maioria por meio da urna eletrônica. E como se sabe, o objetivo de veicular grave desinformação é outro.
E nesse momento delicado e turbulento pelo qual atravessa o Brasil, essa publicação de Jair Bolsonaro, assim como inúmeras outras, não se trata de “apenas” uma simples e inofensiva publicação em rede social, pois seu histórico de agitador de multidões e a radicalização que muitos dos seguidores chegaram comprovam que o manual do apito de cachorro está em pleno funcionamento no país.
Jair Bolsonaro opta por elevar a tensão política como nunca na histórica democrática brasileira e impressiona ver uma assustadora história sendo escrita na vida democrática brasileira com o protagonismo de um líder populista despreparado, que passou 4 anos destilando teorias conspiratórias, mas que conseguiu arregimentar e adoecer parte significativa da população brasileira.
É estarrecedor ver pessoas que, após serem presas nos atos golpistas do dia 8 de janeiro e levadas para a triagem pela Polícia, ainda não tinham se dado conta que seriam duramente responsabilizadas, na forma da lei, após um longo processo criminal.
Seja como for, a democracia brasileira não se curvará à sanha golpista de quem quer que seja, e os conspiradores devem pagar com o rigor da lei.